quinta-feira, 8 de junho de 2017

1717-2017: TREZENTOS ANOS DE MAFRA

Foto de Nova Portugalidade.



Um projecto que excedia a grandeza das proporções daquela montanha 
de pedra: a ambição de um soberano que o papado elevou a Majestade 
Fidelíssima, emulando os reis de Espanha e de França, e a manifestação 
programática de quem reivindicava para Portugal o papel de potência 
católica de primeira grandeza com mandato missionário na Ásia e na 
América. 

O Convento de Mafra nunca foi compreendido pela historiografia 
portuguesa dos séculos XIX e XX. Se o reduzirmos à expressão 
da caricatura, escoadouro do ouro e de energia gratuita, e se o tentarmos 
compreender nas coordenadas do Memorial, é certo que canhestramente 
o situaremos como manifestação de megalomania e desperdício. Porém, 
em Mafra está a manifestação de uma potência e influência que Portugal 
não mais voltou a ter, de uma segurança psicológica e até de um toque 
de boa altivez que tanta falta faz na relação dos Estados com o mundo 
exterior.

É sabido que desde o século XIX se montou intensa campanha difamatória 
contra a dinastia de Bragança e contra a nobreza supostamente decaída 
a partir "absolutismo" do período joanino. Em Rebelo da Silva (A Última 
Corrida de Touros Reais em Salvaterra, 1848; A Mocidade de D. João V, 
1852-53), em Oliveira Martins (História de Portugal e Portugal 
Contemporâneo), em Junqueiro (Pátria, 1896), em Júlio Dantas (Os 
inquéritos médicos às genealogias reais portuguesas - Avis e Bragança, 
1909) e até na sempre frágil preparação historiográfica de Saramago 
perpassam a "maldição dos Bragança", a "degenerescência" da 
estirpe - beata, casmurra, idiota, caprichosa, reaccionária, decrépita, 
sifilítica, vítima da consanguinidade, violenta ou afásica - e a sua 
responsabilidade no Finis Patriae.

Sim, dizem as mentes anacrónicas, "Dom João V devia ter investido em 
manufacturas, em vez de pedras e religião". O lugar-comum não resiste 
à mais leve e honesta prova. Dom João V investiu muito em cultura, em 
conhecimento e em ciência. Não, Portugal de D. João V não era, 
como diz a historiografia oitocentista, um país bisonho, um "reino 
cadaveroso", "supersticioso" e fora das grandes correntes do pensamento 
ocidental do tempo. Para contrariar tais estórias, leia-se a obra de Henrique 
Leitão, que vai ano após ano lapidando as fanadas mentiras que se foram 
acastelando desde há mais de século e meio sobre aquele monarca a 
quem Lisboa deveu dois observatórios astronómicos e a mais persistente 
política de mecenato cultural, tecnológico e científico da nossa história. 
Portugal era, ainda no século XVIII e graças à Companhia de Jesus - 
um verdadeira internacional de conhecimento - um país tocado pelas musas 
do engenho, do experimentalismo e da curiosidade.

MCB


Sem comentários:

Enviar um comentário