terça-feira, 13 de junho de 2017

A IMPORTÂNCIA DA LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO


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Começo por agradecer a tão honrosa atribuição da medalha Jorge Amado, um gesto que muito me comoveu. A responsabilidade de vir falar na União Brasileira de Escritores deixou-me bastante preocupado, porque eu gostaria de vos dizer alguma coisa de original e que justifique a vinda aqui de tão ilustre audiência.

Há muitos anos que me preocupo com a preservação da Língua Portuguesa. As independências das Nações que há mais de 500 anos se encontravam associadas a Portugal, acontecidas frequentemente de modo dramático, (fruto da guerra-fria existente na época entre a União Soviética e muitas democracias ocidentais), criaram situações de ruptura.

Felizmente, poucos anos passados notou-se que os laços afectivos existentes entre as várias comunidades que partilhavam uma nacionalidade comum com os Portugueses, conseguiram ultrapassar as divergências políticas e os ressentimentos inevitavelmente provocados pelas guerras da independência.

O Brasil não sofreu esse problema, graças à inteligência política dos próprios líderes independentistas brasileiros e dos meus Avós, D. João VI e Imperador D. Pedro I. É também de tomar em conta que o movimento independentista foi, obviamente, conduzido pelos descendentes dos Portugueses que colonizaram o Brasil. Tal não aconteceu em África. Mas todos os movimentos independentistas nas Províncias Ultramarinas Portuguesas em África sempre se esforçaram por cultivar a Língua Portuguesa como elemento indispensável da unidade nacional, em territórios habitados por populações que falam “muitas e desvairadas línguas”, como se dizia antigamente.

A actual multiplicidade de países que assumem o Português como Língua oficial torna a nossa Língua comum politicamente muito mais relevante, sendo a quinta língua mais falada do mundo. Este facto tem, para além do seu interesse cultural, uma grande importância económica e política.

Quando examinamos o espólio riquíssimo de aquisições feitas pela Língua Portuguesa dos sucessivos sedimentos, que no espaço ibérico começa cerca de 5.000 anos A.C., (e de que é testemunha a profusão de “antas” ou “dólmens“ por todo o território), encontramos legados que incorporámos dos numerosos povos que habitaram o território: Iberos, Celtas, Lusitanos, Germânicos, Fenícios, Gregos, Cartagineses, Romanos, Arabo-berberes e Africanos.

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Curiosamente as palavras portuguesas mais antigas derivam do sânscrito. Essas palavras encontram-se nos nomes de rios e montanhas que são os que geralmente sobrevivem às diferentes invasões de novas populações. É o caso dos nomes que incluem a sílaba –ar: Arouca, Arunca, Arade, etc. Essa riqueza deu ao idioma português uma densidade e, em simultâneo, uma plasticidade particular. A plasticidade vai reflectir-se, sobretudo, na “exportação” do nosso léxico pelas terras longínquas onde estivemos e onde, maleáveis por natureza e maleáveis por necessidade, vamos procurar apreender conceitos. Assim o Português não funciona apenas por dinamismo relacionado com a Expansão, mas também por porosidade recolectora. Enriquece-se com esplendor, aditando a si mesmo esse fenómeno impressionante que é o das “crioulidades”, funcionando por denominador comum. Por exemplo, o crioulo de Cabo Verde entende-se com o de Macau, sem lógica de comunicação geográfica. Em minha opinião, tudo indica que linguistas de famílias de Judeus Sefarditas Portugueses terão criado uma gramática mais simples e que seria a famosa “língua franca” que serviu de meio de comunicação em todo o Oriente, África e Antilhas. Os Holandeses, Ingleses e outros povos europeus tiveram que aprender essa linguagem quando começaram as suas próprias viagens comerciais. Só nos territórios sob administração portuguesa é que a língua oficial portuguesa se estabeleceu. As próprias palavras papiar e papiamento nunca fizeram parte da Língua Portuguesa oficial, mas significam bater um papo. Actualmente a Língua Portuguesa encontra-se em risco de perder importância em vários países e territórios.

Em Macau é pouco praticada e só é ensinada em algumas escolas. Em Goa, desde que foi conquistada pela União Indiana em 1961, o Português deixou de ser usado no ensino oficial e há muito pouco material de leitura. Na Guiné-Bissau, apesar de ser a Língua oficial, menos de metade da população costuma utilizá-la. Um dos motivos é a falta de material de leitura, inclusive nas próprias escolas. Torna-se mais fácil comprar livros em francês nos países vizinhos. Em Moçambique o problema é semelhante, mas desta vez devido à forte influência do Inglês, falado em todos os países vizinhos. Neste País, pelo menos, os programas de televisão são em Português. Em Cabo Verde a Língua Portuguesa é usada obrigatoriamente em todos os programas escolares e há edição de livros, mas há intelectuais que pretendem que o Crioulo deveria ser a Língua oficial. Timor-Leste foi ocupado pela Indonésia em 1975, e só recuperou a sua liberdade no ano 2000. Durante a ocupação era proibido o ensino da Língua Portuguesa que continuou, no entanto, a ser praticado nos Seminários católicos. A nossa Língua foi sempre a língua oficial da resistência. O primeiro Governo de Timor independente declarou que o Português seria a Língua oficial junto com o Tétum, que é uma língua formada pela mistura de Português com algumas das antigas Línguas timorenses.

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As Nações Unidas, que administraram Timor durante uns anos após a partida dos Indonésios, faziam pressão para que a segunda língua fosse o Inglês. Actualmente falam Português os que frequentaram pelo menos a escola primária antes de 1975 e as crianças que a frequentaram depois de 2000. A pobreza da maioria da população, e as dificuldades do próprio Governo, levam a que haja uma grande falta de livros e publicações em Português. Como Presidente da Fundação D. Manuel II, estou a concluir em São Paulo um acordo de cooperação com a Fundação Padre Anchieta para poderem ser fornecidos à televisão de Timor os excelente os filmes aqui produzidos. Espero que este acordo de cooperação possa também ser utilizado nos outros Países Africanos onde a nossa Língua possa estar em risco de se tornar irrelevante. Não seria caso inédito se soubermos que a Língua oficial da Irlanda é o Gaélico, mas que menos de 20% da população o consegue utilizar. A Fundação D. Manuel II, registada também em Timor, vai editar a primeira revista timorense em Língua Portuguesa. Chama-se Surik, que significa espada em Tétum. Terá algumas páginas com histórias em quadrinhos, para interessar as crianças. Abordará temas de interesse geral para a população. Seria muito interessante se houvesse instituições brasileiras que pudessem dar algum apoio a esta iniciativa, desde comprar publicidade na revista, até à sua divulgação ou participação com artigos. Creio que seria do interesse estratégico e económico do Brasil de manter a nossa Língua comum no único País da região Ásia-Pacífico em que é língua oficial. A médio prazo as capacidades económicas de Timor serão francamente melhores que as actuais, devido às grandes reservas naturais de petróleo e gás, e devido também ao investimento humano na educação e no desenvolvimento que Portugal tem feito. O Brasil tem dado também um generoso apoio a algumas iniciativas a este nosso País irmão. Logo após o fim da ocupação indonésia de Timor, perante as várias necessidades sentidas pela sua população, a Fundação D. Manuel II considerou que era preciso agir no campo da cultura. Para esse fim oferecemos, com o apoio do movimento monárquico Português e dos militares portugueses que para lá foram destacados, um equipamento gráfico de excelente qualidade. Este é gerido pela Gráfica Diocesana de Baucau, com o apoio de voluntários Portugueses. Lá produzem-se os documentos oficiais timorenses e bastantes livros encomendados pelas Nações Unidas, União Europeia, etc.

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Infelizmente, as encomendas feitas por estas duas instituições têm sido em Tétum…Têm também recebido encomendas para a Austrália. A nova revista será impressa lá e espero que tenha alguma difusão no estrangeiro. O endereço de correio electrónico desta Gráfica é: costamario71@gmail.com. A correspondência deverá ser enviada ao cuidado do Senhor Padre Mário da Costa Cabral. A Directora é a Senhora Dra. Gabriela Carrascalão: gabrielacarrascalao@gmail.com. Esta Senhora, de uma ilustre Família timorense, é jornalista profissional. O Conselho da Redacção é presidido pelo ex-Presidente da República e Prémio Nobel da Paz, Dr. José Ramos Horta. A preservação e o desenvolvimento do uso da nossa Língua tem obviamente um grande interesse económico. Nesse campo a influência do Brasil é absolutamente primordial para ter sucesso numa época em que o Inglês já assumiu uma posição dominante no mundo como língua franca. O Espanhol, ou Castelhano, está também a tornar-se muito influente no continente Americano, incluindo nos Estados Unidos. Espanha tem uma estratégia de substituir o Português sempre que possível. Os falantes de Castelhano têm uma óbvia dificuldade em aprender outras línguas, por terem menos sons na sua própria, e por isso preferem que os outros aprendam a sua. Os nossos aliados são os Galegos e os Catalães que não estão de acordo com esta política… É muito feliz a política brasileira de reciprocidade em relação aos vizinhos, que se comprometem a ensinar o Português quando no Brasil se ensina o Castelhano. A constituição da CPLP é um fenómeno muito interessante porque é um grupo de países que se une primeiramente por motivos culturais e afectivos, antes dos interesses económicos ou de defesa mútua. O outro exemplo poderá ser a Commonwealth britânica, mas nessa os interesses económicos e de segurança são predominantes. No entanto, é importante reforçarmos os interesses económicos e de segurança, pois estes garantem, a longo prazo, o interesse mais imediato por parte dos políticos e das empresas. Facilitar a livre circulação entre os nacionais dos Países da CPLP seria um passo muito positivo. Na Europa existe o programa Erasmus em que estudantes podem fazer um semestre ou um ano da sua licenciatura num outro dos vários países da União Europeia. Eu tenho proposto a criação de um programa semelhante para a CPLP, que poderia chamar-se Programa Padre António Vieira.

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Obviamente que isso não deveria ser confundido com uma liberdade de imigração, porque esta iria provocar graves problemas para todos. Temos que lembrar que a fuga de pessoas qualificadas de países menos desenvolvidos tem um impacto mais grave do que a imigração idêntica em países desenvolvidos. Dentro da própria Europa há grandes comunidades portuguesas e brasileiras estabelecidas, principalmente em França, Holanda, (onde também há uma grande comunidade Cabo-verdiana), na Alemanha, no Luxemburgo (onde chaga s ser ¼ da população activa), na Suíça e no Reino Unido. Frequentemente os filhos dessas famílias vão perdendo as suas raízes culturais lusófonas, por não terem acesso ao ensino da Língua Portuguesa na escola. Há algumas excepções, conquistadas com grande esforço, em que as escolas aceitaram incluir no seu programa o ensino do Português. O mesmo problema existe nos Estados Unidos e no Canadá, onde há grandes comunidades brasileiras e portuguesas e onde a situação é semelhante. Há também uma imigração portuguesa mais pontual um pouco por todo o mundo, incluindo para a Ásia e Médio Oriente, África e Timor. São ainda de referir as comunidades lusófonas existentes na Namíbia, África do Sul, Paraguai e Uruguai. Actualmente alguns programas de voluntariado têm levado a uma presença portuguesa expressiva em vários lugares de África e do mundo com grandes carências.

Devido a acidentes da História, Portugal separou-se da Galiza no começo da sua nacionalidade mas, até hoje, ambos os povos sentem essa ruptura. Nas palavras da Poetiza Galega Rosália de Castro: Vendo-os assim tão pertinho, / a Galiza mail’ o Minho, / são como dois namorados / que o rio traz separados / quasi desde o nascimento. Deixal-os, pois, namorar / já que os paes para casar / lhes não dão consentimento. Actualmente o pai, Portugal, já veria com bons olhos o casamento, mas tem vergonha de o assumir. A mãe continua totalmente contra, mas os filhos cada vez ligam menos… Hoje em dia costuma-se dizer que na Galiza falam o Português da Galiza. Os Galegos pretendem aderir à CPLP como região autónoma, que já são, e mudaram a ortografia oficial de muitas localidades. Essa região tem hoje uma economia próspera e uma vida cultura interessantíssima. A televisão galega, os grupos de música popular, livros, etc., têm contribuído muito para este enriquecimento cultural. No entanto, nota-se que muita gente fala o Galego com pronúncia castelhana porque só aprenderam a falá-lo na escola. Mas nas famílias rurais a pronúncia é igual à minhota.

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Curiosamente os emigrantes do Norte de Portugal iam junto com os Galegos para o Brasil e por isso aí ficaram frequentemente conhecidos pela alcunha de Galegos.Cada língua é uma pátria, cada pátria é uma mátria, uma comunidade de afectos. A nossa Língua tem o embalo da Poesia e o regaço da Mãe do Céu. Tem o coração heróico de quem tem fé, e a humildade discreta e firme de quem ama.

A nossa Língua é um porto de chegada, de abrigo e de sustento, e de partida para o Mundo. Poder vir, ficar, partir e voltar. São as lágrimas salgadas do mar de Portugal, e o “amar, amar perdidamente” da sua gente.

As vastidões de Portugal marcaram os corações. A solidão do isolamento fez alegres os encontros. Trás-os-Montes, Beiras, Alentejo; os montes, a serra, a planície… O Minho e o Ribatejo verdejam e afadigam-se no corre-corre da labuta; dançam contentes e adornados nas suas feiras.

E toda a costa se encosta ao mar, se debruça à sua vista, adormece à sua beira. Deste “cantinho à beira-mar plantado” vê-se o mar, e vê-se o mundo. De perto ou de longe, vê-se com o coração.

Por onde passou deixou o fascínio do outro, e a saudade de casa. Tornou-se da casa e casa de todos na sua Língua. Virou “Saudades do Brasil em Portugal”, “África minha”, epopeia asiática, este “imenso Portugal” da Lusofonia.

Agora, neste tempo informado há pressas pagas pelo sofrimento de muitos e há silêncios de horror.

Que esta nossa Língua possa ser Casa de todos os filhos, semente de um mundo de encontros, de respeito, de alegria e gratidão.

São Paulo, 16 de Março de 2016
Dom Duarte Bragança

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