São necessários, um projecto e um programa políticos e pelo menos um esboço do que se pretende que seja uma Monarquia futura, e que aproveite esta revitalização do credo Monárquico que se propaga como ar fresco pelas redes sociais, e que qual nova doutrina entusiasticamente pugna por um modernizado regresso à estrutura política monárquica, até pré-monarquia-constitucional, em que o papel da Democracia Directa era uma constante, ao contrário do actual republico-parlamentarismo em que umas quantas dinastias de jacobinos saídos da febril implantação republicana, e, de influências intelectuais seleccionadas, se cedem à vez. A desagregação deste modelo republicano falhado é vertiginosa, pois ‘pilriteiro dá pilritos, a mais não é obrigado’, e vive-se, hoje, numa Partidocracia, com uma alternância no poder dos maiores partidos – mais ou menos apoiados em partidos-bengalas, mais ou menos reféns das suas ideologias -, rotativismo no qual existe uma comunhão nada saudável que apenas facilita a distribuição de sinecuras, vulgo “tachos”. Uma falsa representatividade na qual o poder não é exercido pelo Povo, mas numa alternância de facções, um novo situacionismo marcado por um modelo eleitoral vencido, derrotando a perspectiva de verdadeira Democracia. Não existem verdadeiramente ideologias, mas caça às benesses, não passando a política de uma simples conciliação de sinais contrários, onde emerge, como consequência nefasta e motor, a corrupção. Os políticos são um caso acabado de cépticos sem sentido de missão que procuram enriquecer. Falam em progresso só em termos de melhoramentos materiais, porque há muitas estradas, falam em boa-economia onde só se agravou uma dominância banco-financeira, bem como uma ilusão de crescimento dependente da engenharia financeira. Foi assim que o País ficou dependente do empréstimo estrangeiro. O establishment do sistema político institucional, marcado pelo caciquismo perdeu real representatividade. Houve, de facto, um esvaziamento moral triturado pela máquina da rotina do poder, onde os delfins do sistema tentaram uma evolução na continuidade que não conseguiu dinamizar a sociedade. Hoje, estão esgotadas todas as fontes ideológicas deste sistema político, que se tornou um mero centro de emprego.
Importa lembrar que na Monarquia os Reis Portugueses exerciam a Soberania por delegação da Comunidade por intermédio de um pactum subjectionis em que o mandato real era limitado, uma vez que o poder vinha directamente de Deus para o Povo tendo estes súbditos o poder in habitu e os reis apenas o poder in actu. Ora, um dos elementos que influenciaram a formação do constitucionalismo foi a doutrina do pactum subjectionis, pela qual, o Povo confiava no governante, na condição de que o governo seria exercido com equidade, legitimando-se o direito de insubordinação popular caso o monarca violasse as regras das leis fundamentais do Reino e dessa forma o pacto subscrito pelo monarca e pelos súbditos. Assim o poder real não era Absoluto, mas limitado pela doutrina do Pacto Social - ideia de que a autoridade dos governantes se fundava num contrato com os súbditos (pactum subjectionis). Era claro, um Poder Monárquico tradicional e paternal, pois os Reis eram o lugares-tenentes de Deus na Terra, mas todos eles reinaram a favor do Povo uma vez que uma má administração da Nação os inabilitaria de serem Reis. Porém, foi esse pacto a base da Monarquia Constitucional que é um regime político que concilia a forma de governo monárquico - em que a suprema magistratura do Estado se transmite por via hereditária entre os descendentes da Dinastia reinante - com a subsistência de uma Constituição. O Monarca será um de diferentes órgãos do Estado e que exercerá os poderes que lhe estarão consagrados na Lei Fundamental do País, que pode ser escrita ou não (como no Reino Unido).
‘Vós sabeis que o solo, que hoje chamamos Portugal, não conheceu desde séculos remotos outro Governo Político, que não fosse o Monárquico-Representativo. Prelados e Grandes Senhores formavam unicamente esta Representação: o Povo não tinha voz nem acção num regime quase feudal. Os Reis Portugueses, pouco depois do princípio da Monarquia, concederam ao terceiro Estado os direitos e a dignidade que os séculos bárbaros lhe haviam negado. Floresceu então Portugal à sombra de um Governo completamente Representativo: porém, não havendo Leis que fixassem de um modo invariável as Instituições adoptadas pela prática e tradição dos Maiores, vieram estas a cair em esquecimento; emudeceram as Cortes da Nação e estava reservado para os nossos dias renová-las por meio de estabelecimentos sábios e permanentes.
Tal foi o projecto que, na Sua Real Mente, concebeu Meu Augusto Pai [D. João VI], cuja memória será sempre cara aos Portugueses; e tal foi o que com glória imortal executou Meu Augusto Irmão [D. Pedro IV], felicitando esta Nação com a nova Carta Constitucional...’, assim constou o Discurso do Trono da Infanta Regente D. Isabel Maria de Bragança, de 30 de Outubro de 1826.
Nesta Monarquia Restaurada, o seu Governo será Monárquico, Hereditário e Representativo e tal como previa a Carta Constitucional de 1826, in ‘Do Poder Executivo, Art. 75º: ‘O Rei é o Chefe do Poder Executivo, e o exercita pelos seus Ministros de Estado.’ Ou seja, os Reis não são primeiros-ministros ou ministros, mas presidentes dos ministros. Os ministros governam os assuntos e negócios de Estado, o Rei governa os Ministros.
Assim, hoje, a Monarquia que queremos será uma Monarquia Constitucional, que terá legitimidade democrática, pois os órgãos que efectivamente exercem o poder político conquistam a sua legalidade e legitimidade das eleições por sufrágio directo e universal. Assim sendo, originariamente, o poder reside no Povo, contudo exerce-se sob a forma de governo monárquico. O Parlamento será democraticamente eleito e deverá ser por Círculos Uninominais ou, ainda melhor, por Voto Nominal, onde será possível ao cidadão-eleitor fazer a sua escolha em função de pessoas que conhece e que poderá responsabilizar, se for o caso; diferente do actual sistema eleitoral falsamente representativo pois não permite aos eleitores elegerem os seus deputados. É imprescindível um sistema eleitoral que permita a eleição dos deputados pelos eleitores, e não exclusivamente pelos partidos, como sucede actualmente. A eleição dos deputados para o Parlamento deve assentar num sistema de eleição individual, por método maioritário. Só este sistema ampliará o papel democrático do deputado eleito tornando-o em real representante de toda a comunidade do seu círculo eleitoral, imputando-lhe uma responsabilidade individual perante os seus eleitores correspondentes através da criação de vagas para candidaturas autónomas, imprescindíveis para voltar a despertar o interesse dos cidadãos pela política, longe das conveniências salinadas dos partidos políticos do arco do poder e seus satélites. Reforçaria, tal-qualmente, a fiscalização dos que seriam, verdadeiramente, legítimos representantes do Povo que teriam de receber e ouvir os seus eleitores e de corresponder às suas legítimas expectativas.
O actual sistema eleitoral proporcional, de círculos plurinominais e do domínio de listas fechadas partidárias para a eleição dos deputados nacionais, tem demonstrado ser um sistema representativo em que a relação entre o deputado e o eleitor é inexistente, as preocupações reais das populações são relegadas para segundo plano e substituídas pelos interesses dos lóbis e das agendas particulares dos partidos políticos que têm um pacto instituído. Assente no método proporcional e de Hondt é uma total desvirtuação da democracia política e eleitoral: não só despreza muitos dos votos, como os nulos e os brancos, assim como a abstenção, e que assim de nada servem para a efectiva escolha e eleição dos candidatos, como ignora o sentido real do voto no candidato efectivamente escolhido pelo eleitor, pois limita-se a distribuir os votos dos eleitores por quotas consoante o número de candidatos a eleger. Neste método os eleitores ao preencherem o seu voto estão apenas a ratificar uma lista pré-preenchida e uma aritmética pré-determinada de distribuição dos votos entre os partidos políticos com representação parlamentar. Assim, as actuais listas fechadas, e assim partidárias, submetidas ao sufrágio popular fazem dos deputados meros representantes dos partidos e dos seus interesses.
Implementando um efectivo sistema de eleição dos deputados para o Parlamento, baseado na sua eleição pessoal e individual, por método maioritário, regional e local, com voto nominal ou pelos círculos eleitorais uninominais, permitirá o surgimento de candidatos independentes locais, das forças vivas da sociedade, desde a base da população até ao topo, desprendida dos partidos políticos tradicionais e dos seus interesses, despertando a participação dos cidadãos na política, e tendo estes, também, uma acção fiscalizadora, pois só passará a haver uma verdadeira democracia parlamentar em Portugal, em que os cidadãos sejam a prioridade e pondo fim ao regímen de partidocracia – o exercício do poder legislativo não pode ser exclusivo dos partidos políticos. Depois, num Parlamento representativo uma Proposta do legislador será apresentada no Parlamento, depois debatida na comissão parlamentar, que depois a remeterá novamente ao Parlamento que a enviará ao Monarca que dará o seu Assentimento Real e todas as leis serão aprovadas em nome do Rei. O Soberano poderá, conceder o Assentimento Real (fazer a proposta tornar-se Lei) ou recusar (vetar a proposta). A Prerrogativa Real incluirá, ainda, poderes, tais como os de demitir o Governo, dissolver o Parlamento, fazer tratados ou enviar embaixadores e conceder distinções; e obrigações, tais como o dever de defender a Soberania Nacional e manter a Paz. Da mesma forma, nenhuma pessoa poderá aceitar um cargo público importante, sem prestar um juramento de fidelidade ao Rei e à Nação.
É necessária, ainda, profunda e cuidada descentralização administrativa que dê às regiões, às localidades e municípios a sua autonomia e que será enriquecida com a conciliação das classes. É necessário um governo descentralizado da Nação, contraposto ao pesado, burguês e impessoal aparelho burocrático central. Não podemos continuar a ser governados por maçons, plutocratas e estrangeiros.
Assim, teremos uma Monarquia em que o Rei será o principal defensor da Coisa Comum e que promoverá o Bem Geral da Nação e que com o seu exemplo de virtude, honestidade e suprapartidário – o Rei não tem partido, não toma partido… é português por inteiro - fará reflectir no Parlamento, nas estruturas do poder local - os Municípios – e na sociedade em geral essa probidade inatacável.
De facto, Hoje, qualquer restauração Monárquica não pode ser independente de uma profunda reforma do sistema político, aliás nem seria viável doutra forma, pois o Povo exige nas ruas e no éter internauta que a política portuguesa volte a ter aquela indispensável ética que pugne pela defesa do bem da coisa comum e só assim a Monarquia Futura e o Rei a Ser serão entidades com real legitimidade e geradores de consenso popular.
Miguel Villas-Boas