Uma Perspectiva Geral (1.ª Parte)
Saber se as raças Teutónicas são superiores às raças latinas é uma questão controversa, sujeita a pontos de vista eivados de preconceito. Seja como for, não persiste dúvida de que existe verdadeiramente uma grande diversidade nas instituições da religião, da lei, língua, costumes, moda e preceitos morais entre, digamos, os Anglo-Saxões e os Portugueses. Por outras palavras, a nação Inglesa desenvolveu um modo de vida Inglês, assim como os Portugueses se adaptaram ao seu meio, enfrentando a natureza de sua própria maneira.
Assumamos por um momento que estas duas nações, com os seus desiguais hábitos e tradições, fossem plantadas no Novo Mundo. Assumamos que uma vive num clima quente temperado e a outra em condições equatoriais. Assumamos que a primeira nação pode estabelecer uma colónia por suas próprias forças, opondo-se ao casamento dos seus nacionais com membros de outras raças; e, então, imaginemos o segundo caso, no qual existem uns poucos colonos em povoações destituídas do belo sexo, com os consequentes matrimónios entre nativos e Europeus, e uma larga população mestiça como resultado de um tal conúbio. Considerando essa diversidade de carácter nacional, de constituição dos indivíduos, de ambiente natural e social, poderíamos esperar que dois povos reagissem com idêntica atitude a uma dada instituição social? Não é causa de espanto, então, que a escravatura nas colónias Inglesas do Norte da América fosse instituição muito diversa da que existia no Brasil.
A terra do Brasil era lavrada por trabalho escravo muito tempo antes da colónia de Jamestown, e ainda abundava em hordas de escravos nas suas plantações até um quarto de século volvido sobre a proclamação da Declaração de Independência dos Estados Unidos. Já em 1585, Pernambuco podia contar 10.000 escravos Africanos e a Baía algo como três ou quatro mil, enquanto o primeiro transbordo de escravos para as colónias Inglesas na América foi introduzido no porto de Jamestown por um navio holandês somente em Agosto de 1619.
No Brasil o tráfico de escravos recebeu um ímpeto por efeito de restrições reais e da oposição dos Jesuítas à redução dos Índios à escravatura, compelindo os colonos mais dóceis e obedientes a abandonar a exploração do trabalho nativo e a voltar-se para África em busca de braços. A procura de trabalho das grandes plantações sacarinas, dos campos de algodão, das culturas de tabaco, e, mais tarde, das minas, manteve ocupados os caçadores de escravos nas costas da Guiné e de Angola, de tal forma que pelo meio do século dezoito os escravos eram introduzidos no Brasil em vasta escala. Entre 1759 e 1803, a acreditar em Keller, os registos coloniais dão como consignados da Angola ao Brasil 642.000 Negros. Assim, em 1800, metade da população do Brasil de 3.200.000 eram escravos, e em 1818 habitavam o Brasil 1.930.000 escravos, para além de alguns 526.000 negros livres e mulatos, compondo sessenta e três por cento do total. A meio do século dezanove existiam perto de três milhões de escravos entre uma população de sete milhões e meio. Lord Palmerston estimou o número total de escravos nos anos sessenta em 3.000.000; enquanto um articulista na “Revue de deux Mondes” fixa o número entre 2.000.000 e 4.000.000. Dawson cita o número de escravos em 1856 como perfazendo aproximadamente 2.500.000 ou quarenta por cento do total da população. Tanto quanto parece, não existe correntemente um censo disponível do número de escravos para este período. Tanto quanto se pode estimar, os escravos compreendiam de quarenta a cinquenta por cento da população, e se adicionarmos todos os mestiços obtemos a maioria dos habitantes do Brasil.
Olhemos agora para o Velho Sul. A escravatura como a conhecemos difundiu-se lentamente nas colónias do sul e até um limiar insignificante nas colónias da Nova Inglaterra. O chamado “Asiento” de 1713, pelo qual a Grã-Bretanha, no termo da Guerra de Sucessão Espanhola, assegurou o direito de providenciar anualmente às colónias de Espanha 4.800 escravos, aumentou o comércio de escravos no Novo Mundo. Os negros eram procurados para os arrozais, para os campos de algodão e para as plantações de tabaco. em 1710 apenas 50.000 escravos habitavam os Estados Unidos; o seu número aumentou para 220.000 em 1750 e para 464.000 em 1770, e até ao ano de 1790 para cerca 697.624. Este número constituía um quinto da nossa população total.
A escravatura, todavia, não era uma instituição veneranda no Sul no século dezanove. Na verdade, subsistia antes pela força do hábito e pelo medo do que a emancipação poderia trazer. Então, apareceu a fiadeira de algodão de Eli Whitney. O Sul foi acometido pela febre do algodão. Os Estados Unidos erigiram-se no produtor de algodão bruto do mundo. Doravante, a escravatura seria tida como “o instrumento económico indispensável da sociedade sulista”.
Durante a primeira metade do século XIX, então, a escravatura na América estava no seu apogeu. Em 1850 os escravos ascendiam a 3.204.313, uns poucos milhares menos do que no Brasil, que, ao abrir do século, tinham liderado no número de escravos detido. Blake, escrevendo em 1857, demonstra que pelo último censo, contudo, diferentemente do Brasil, a proporção de pretos para brancos não era grande, estando na vizinhança dos catorze por cento. Porém, se considerarmos a nação por secções, o rácio de pretos para brancos no Sul era de um para dois, enquanto no Norte era de um para sessenta e oito.
(Na fotografia, escravos na colheita do café no Brasil)
* A Nova Portugalidade traduz e publica por partes o interessantíssimo artigo de Herbert B. Alexander, «Brazilian and United States Slavery Compared» (1922). Não obstante se julgar valioso o presente contributo historiográfico, as particulares opiniões expressas no texto são da responsabilidade exclusiva do Autor. O texto original pode ser lido no seguinte endereço: https://en.wikisource.org/ wiki/ Brazilian_and_United_States _Slavery_Compared.
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