sábado, 13 de outubro de 2018

Urgente regressar à Ásia

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Os estudos coloniais e pós-coloniais estão na moda. Infelizmente, só um punhado de portugueses, grandes leitores e atentos aos escaparates das editoras transelvenses - aquelas que estão para lá da fronteira, pois aqui não se publica, vai-se publicando - se dá conta das novidades. 

Se os estudos africanos ainda se sustêm graças à torrencial produção conseguida pelos exaustivos levantamentos antropológicos realizados ao longo da década de 60 pelos saudosos Instituto Superior de Estudos Ultramarinos e Junta de Investigação do Ultramar, os estudos orientais nunca tiveram grande tradição em Portugal. Se nos séculos XVI e XVII fomos pioneiros no domínio das línguas e culturas orientais, como o atestam as Cartas Ânuas, os trabalhos de Francisco de Pina na romanização do vietnamita, a Arte breve da lingoa japoa, de João Rodrigues, ou ainda nessas figuras heróicas de António de Andrade, Francisco de Azevedo, Bento de Góis e João Cabral, que da Índia partiram rumo ao Tibete, perdemos todo o interesse pela matéria oriental. Do colégio de Évora saíam missionários com conhecimentos elementares de Guóy (mandarim clássico) e do Seminário Maior de Macau exímios tradutores de japonês e calígrafos de sinogramas. Depois, com os Brasis e as Áfricas em primeiro plano, esquecemo-nos. Em finais de Oitocentos, Vasconcelos Abreu reabriu brevemente a tradição, sendo o último dos portugueses a poder ler o Sutta-pitaka, o Tripitaca, o Ramayana ou o Mahabharata. Tornamo-nos ágrafos na matéria. Ignorantes, também, todos os quadros coloniais e diplomáticos que aportavam a Goa, a Macau, embaixadas e consulados sem saber balbuciar uma palavra e decifrar um caracter. Este afastamento da realidade asiática teve os seus efeitos perniciosos, hoje bem evidentes, no desinteresse, que estimo suicida, da diplomacia portuguesa em relação ao Oriente.

Sem um Instituto de Estudos Orientais, sem um curso superior em línguas, culturas e história orientais, como poderemos ambicionar ao tráfico comercial, à penetração nos mercados, à cooperação cultural, científica e tecnológica com as potências emergentes da Ásia do Sul e do Extremo-Oriente ? A vastidão bibliográfica dos temas relacionados com o Oriente seria motivo sobejo de interrogação, inquietação e espanto se fossemos conscientes do que tal representa. Mas não, ninguém quer saber. 

A qualquer momento a Ásia cai-nos em cima. Não faz mal, não será amanhã: talvez depois de amanhã.

MCB



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