domingo, 9 de setembro de 2018

Hoje é dia da Independência do Brasil. Mas o Brasil nunca deixou de ser um país português


Outro dia estava lendo as críticas muito bem colocadas do grande tradicionalista católico americano Christopher Ferrara acerca do mito da "revolução conservadora" - porque feita em defesa da normalidade e do direito - que teria sido a independência dos Estados Unidos. Coloquei-me a pensar a respeito do processo de independência do Brasil.

Certamente houve uma ruptura entre os dois países portugueses de Portugal e do Brasil, mas esta ruptura não foi causada pelo Brasil, nem pela velha e tradicional classe política portuguesa. Tal ruptura se deu por motivo do levantamento do Porto, que tomou Lisboa, fez Cortes Gerais contra a vontade do Rei Dom João VI e exigiu impiedosamente que o povo que recebera de braços abertos a corte portuguesa e dera homens para invadir e tomar a Guina Francesa abrisse mão das liberdades que recebera em 1815. Dom João VI, vindo para cá (para o Brasil), trouxe consigo mais que a sede do governo; trouxe miríade de instituições novas e avançadas, prosperidade e o orgulho da centralidade política ao povo do Brasil. Com efeito, no Reino Unido, a nação portuguesa fazia-se de duas unidades (Portugal e Brasil) perfeitamente iguais à luz do direito.

Outrora Estado da Monarquia, o Brasil passava agora a membro igual do Reino Unido em que se agrupava a nação portuguesa. Não só por questões geopolíticas, mas também pelo amor que adquiriu por essas terras meridionais, no dia 16 de novembro de 1815, decidiu Sua Majestade Fidelíssima elevar o Brasil ao posto de Reino no seio do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, trazendo o Brasil para o palco da história.

José Bonifácio de Andrada e Silva, posteriormente "o patriarca da Independência", já pouco tempo depois sugeriria Dom João VI proclamar-se Imperador do Ocidente, e com aplausos de toda côrte instalada no Rio de Janeiro, pensava-se um gigante geopolítico como nunca visto na Terra. Um Império unificado, espalhado por todos os cantos do mundo, cuja sede estivesse segura no além-mar, e tivesse peso e poder de influência na Europa pela antiga metrópole. Se não fosse por aqueles precipitados revolucionários de Lisboa e do Porto, o que teria sido de nossa Portugalidade?

Conquanto não se possa falar em "se" na historiografia, importa lembrar que embora tenha mesmo sido uma ruptura o 7 de setembro de 1822, ele não foi algo revolucionário como o 4 de Julho de 1776. O rei Jorge III não era um tirano, seus impostos não eram fardos pesados, a revolução americana fora fruto de agitação ideológica.

Na nossa Portugalidade, nem o Rei e nem o povo brasileiro almejavam a separação. Não se circulou nos jornais brasileiros qualquer menção a independência ou clamor por tal coisa até algumas semanas antes de ser efetuada a danosa ruptura. Quem desejava a separação? Uma minoria ressentida e que talvez não compreendesse a profundidade do projeto luso-brasileiro que o Rei Dom João, reconhecendo a importância que o Brasil adquirira no seio do Império, pusera em marcha.

"Tome para si esta coroa antes que algum aventureiro o faça!" - teria sido a frase quem Sua Majestade Fidelíssima mandara a seu filho, o príncipe regente Dom Pedro I (IV de Portugal), simbolizando os laços que se desejavam manter, a despeito de uns poucos precipitados no Porto. Uma ruptura que mais pareceu um acordo familiar para evitar um mal maior, e assim, da ruptura, percebe-se nascer um mar de continuidades. Aqui, depois da independência, continua a reinar a casa de Bragança, com Dom Pedro I e seu filho, Dom Pedro II, e teríamos tido Dona Isabel I não fosse - por ironia do destino - uma nova horda de francófilos precipitados, a derrubar atrapalhadamente o Império e estabelecer um república autoritária.

Vemos na bandeira, o verde da casa de Bragança, a cruz da Ordem de Cristo, herdeira das tradições gloriosas dos cruzados, a esfera armilar símbolo do Império Português, um Estado confessional, uma aristocracia pujante e com muitos laços com a antiga metrópole. Vemos um reconhecimento da independência negociado e indenizado, uma carta constitucional baseada nos mesmos princípios e com o mesmo legislador. As continuidades são tamanhas e tantas, que não seria estranho perguntar: Houve mesmo ruptura? O hino nacional brasileiro tinha já após 1831 trechos melódicos extraídos do Hino Patriótico, antigo hino de Portugal.

O 7 de Setembro não deveria ser lembrado pelo que ele rompeu com Portugal, mas por aquilo que ele manteve de Portugal, pois ele foi a justa defesa por um rei corajoso (Dom João VI) de seus súditos amados no além-mar, quando já prisioneiro das côrtes, permitindo a seu filho tomar as rédeas do destino de uma nação e protegendo-a do autoritarismo de côrtes pouco compreensivas. O 7 de Setembro deveria simbolizar não os conflitos armados entre brasileiros e portugueses, mas um rei que se recusou a mandar seus irmãos nascidos em solo europeu a atirar em seus irmãos nascidos em solo americano, razão pela qual foi necessário às côrtes liberais exigir isso. “Isso não! E nem meu filho tem feito senão o que em suas circunstâncias fazer devia, por agravos a mim pessoais não hão de sofrer os povos!” - Disse Sua Majestade Fidelíssima.

O 7 de Setembro é celebração da continuidade, não da ruptura. De uma civilização, de uma única nação, separada no tempo, no espaço e na história, mas unida na língua e no coração. Se há uma independência que pode ser considerada "conservadora" e feita para a continuidade ela é a do Brasil, não a dos Estados Unidos - ou não foi o Brasil independente verdadeira continuação do Brasil português, não foi ele construído sobre as instituições da era portuguesa, não foram os seus símbolos nacionais os de Portugal, a sua casa reinante a de Bragança e o novo Estado, com efeito, um segundo Estado português? Este 7 de Setembro, celebramos a Portugalidade brasileira.

Arthur Rizzi



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