Li há tempos uma obra que me passara despercebida e cuja capa acima reproduzimos. Le Terrorisme Intellectuel, de Jean Sévillia, é mais do que uma história da cultura francesa contemporânea e suas polémicas: trata-se de original abordagem aos mecanismos de fabricação de um certo tipo de verdade imposta sem debate, à mistura com intimidação, amálgama e sufocação do normal processo de discussão que, juntas, permitem a ciência.
Sévillia desmonta esta engrenagem nascida no imediato pós-guerra. Ao prestígio reclamado pelos comunistas - a tão propalada superioridade moral - foi-se edificando uma teia de lugares-comuns inquestionáveis, umas quantas crenças indiscutíveis, uns adornos pseudo-científicos que concorreram para que a percepção dos acontecimentos coroasse o discurso comunista.
Assim, os intelectuais impuseram até meados dos anos 50 um acrisolado culto por Estaline, tão intenso como cego ao ponto de inverter todos os dados de sensibilidade, rasurar todas as consabidas práticas do tirano e permitir fazer crer aos pacatos leitores de jornais que as causas da paz, da fraternidade entre os povos e da liberdade se encontravam para lá da Cortina de Ferro. Nessas piedosas patranhas acreditaram quase todos. O odioso ficou para os anti-comunistas, tidos como lacaios do americanismo "fascista", do imperialismo" e do belicismo.
Depois, assentaram armas contra o odioso "colonialismo". A esquerda francesa, incluindo o PCF, que sempre havia defendido o império colonial, receberam instruções do Kominform para desencadear a mais que questionável tese dos "ventos da História". Tratava-se, naturalmente, de abrir o campo à acção soviética e carrregar a má-consciência dos europeus, minando-lhes a capacidade de reagir e obrigando-os a reconhecer a inevitabilidade da descolonização. Sévillia desenvolve com particular argúcia esta questão, porquanto desmonta uma a uma as teses da sociologia e historiografia marxistas. Como os estudos mais recentes permitem demonstrar (vide Jacques Marseille, L' Empire Colonial et Capitalisme Français), as colónias jamais enriqueceram os colonizadores; antes pelo contrário, foram um peso acrescido e um freio ao crescimento económico metropolitano, um factor de conflitualidade entre as potências coloniais e um cadinho de problemas políticos internos em cada Estado colonizador.
Mas aos comunistas interessava diabolizar, imobilizar pelo remorso, desconjuntar as forças anímicas de políticos, militares e administradores coloniais. Quando partiam para a Indochina e a Argélia, os jovens franceses já não tinham ao seu lado e atrás de si o incentivo da nação. Não, partiam como vulgares criminosos e opressores dos povos colonizados. Era o tempo que em Ho Chi Mihn se reverenciava como um sábio confuciano, em que Ben Bella reproduzia os românticos guerrilheiros da literatura oitocentista e em que Lumumba, era exibido como "mártir".
Com a descolonização executada, a desonestidade voltou-se para outras empolgantes causas: o multi-culturalismo, o proibido proibir, o ecolo-regressismo, o fim do estado-nação, etc, etc.
Pese a expressão destas fortes correntes, verdade é que lhes falta, a todas, matéria académica credível. Estas opiniões, contudo, ganharam tamanha respeitabilidade que discuti-las acarreta o desprezo da auto-constituída "comunidade de razão", aquela que domina a "inteligência estúpida" do jornalismo, dos "fazedores de opinião" e demais pequenos intelectuais divulgadores.
MCB
Fonte: Nova Portugalidade
DEUS - PÁTRIA - REI
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