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O Partido Popular Monárquico apresentou à Assembleia da República um Projecto de Resolução em que recomendava aquilo que, para muitos portugueses, se tornou uma necessidade óbvia e urgente: a alteração da Constituição de forma a permitir o sufrágio livre e directo do regime político – Monarquia ou República – em que queremos viver.

O Projecto, apresentado pelo deputado regional açoriano Paulo Estêvão, depois de previamente aprovado pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, foi rejeitado pela então presidente do Parlamento nacional, Assunção Esteves, com base em pretextos regulamentares.

Em causa está, mais uma vez, um pequeno parágrafo da Constituição em vigor, que há anos vem sendo contestado nos meios monárquicos (e até em meios republicanos menos facciosos): a alínea b) do Artigo 288º. Na passagem referente aos “limites materiais” impostos em caso de revisão constitucional, esta – diz a lei fundamental – “terá de respeitar” a “forma republicana de governo”. Os contestatários sugerem a simples alteração de uma palavra: que a lei fundamental consagre, em alternativa, “a forma democrática do Estado”.

A luta pela alteração daquele parágrafo da Constituição vem de longe. Logo que a versão inicial foi aprovada, em 1976, vários constitucionalistas e inúmeros políticos contestaram a consagração do regime republicano como obrigatório – mais ainda, como incontestável, já que a lei expressamente proíbe qualquer alteração constitucional que o ponha em causa.


Ao longo dos anos, os partidos do centro-direita têm tratado a questão com algum embaraço: por um lado, não desejam incomodar as forças e figuras do sistema que fazem finca-pé no republicanismo constitucional; por outro, é inegável que o artigo 288º é a negação da própria democracia, ao impedir o povo (teoricamente “soberano”) de escolher o regime político que bem entender.

Nem os exemplos do Brasil e da Austrália, que organizaram referendos sobre o regime (em 1993 e 1999, respectivamente), amaciou o coração de pedra do jacobinismo nacional. O famigerado Artigo continua por rever.

O presidente da Comissão Política Nacional do PPM, Paulo Estêvão, que é igualmente deputado à Assembleia Legislativa dos Açores, iniciou uma nova campanha em favor da revisão constitucional. “Qual é o medo, meus senhores?”, perguntou então. “Em democracia, ninguém é dono do voto de ninguém. Deixem o povo português pronunciar-se sobre a natureza do regime. Não se façam donos da vontade dos portugueses”.

Mas não bastava protestar: uma iniciativa legislativa concreta e fundamentada teria de ser tomada no Parlamento. Não dispondo de representação na AR, o PPM decidiu alcançar o mesmo fim por outros meios.

Assim, por proposta sua, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores decidiu recomendar à Assembleia da República “que promova as alterações necessárias ao sistema político, de forma a permitir o directo e livre sufrágio do Povo Português em relação à natureza republicana ou monárquica do Estado”. Escassos dias depois, a presidente da Assembleia da República indeferia “a admissibilidade do Projecto de Resolução”.

O DIABO publica seguidamente as principais passagens do Projecto de Paulo Estêvão.

Porque não podemos escolher?


O actual regime republicano mergulhou o país numa crise social, política e económica colossal. Os partidos republicanos penhoraram o país de uma forma quase irreversível. O grau de irresponsabilidade política e financeira dos governos republicanos não tem qualquer precedente histórico.

O regime republicano actual é profundamente ineficaz, socialmente injusto, politicamente instável e perigosamente antipatriótico no que diz respeito à preservação da independência nacional no quadro da União Europeia. Devido ao regime republicano, o país perdeu a sua soberania. São os estrangeiros que esboçam o Orçamento de Estado, que determinam a nossa fiscalidade, a nossa política social, a configuração da nossa administração estatal, o nosso mapa municipal, a gestão do nosso mar e até a nossa política externa.

Neste contexto, os próprios políticos da república não têm pejo em afirmar que Portugal não é hoje mais que um simples protectorado internacional. A este estado conduziu a república a nação portuguesa, velha de nove séculos. Não é exagero dizer que “por muito menos que isto rolou a cabeça de Luís XVI”.

Nestas circunstâncias, de perda total de soberania, a restauração da monarquia portuguesa é uma ideia que está a receber o apoio de cada vez mais portugueses. A restauração monárquica é hoje sinónimo de restauração da independência nacional.

Neste contexto, é importante começar por desmontar o embuste republicano desde o seu início. A república mais não é que um regime imposto de forma violenta ao povo português. No dia 5 de Outubro de 1910, um grupo de militares revoltosos, apoiados por civis enquadrados em sociedades secretas – que à luz da terminologia actual poderíamos designar como organizações terroristas – derrubou um governo e um regime legitimado nas urnas […].

A monarquia constitucional portuguesa era, em muitos aspectos, um dos regimes políticos mais democráticos e socialmente avançados da Europa de então. A separação de poderes estava constitucionalmente consagrada desde 1822, o direito de voto abrangia cerca de 70% da população masculina, a alternância partidária no poder sucedeu com grande frequência e, a partir de meados do século XIX, a vida política e social decorreu com grande estabilidade, com o exército subordinado às autoridades civis.

Do ponto de vista social, o progressismo e a modernidade da monarquia constitucional portuguesa ficou também, ao longo desse período, bem patente. Portugal foi, por exemplo, um dos primeiros países do mundo a consagrar constitucionalmente a abolição da pena de morte e dos primeiros a estabelecer o ensino primário obrigatório (logo em 1835, embora sem os resultados e a continuidade desejada).
Repúblicas ditatoriais
O regime republicano que sucedeu à monarquia constitucional não foi, sob muitos aspectos, uma democracia. Existia uma espécie de direito de tendência no campo republicano, mas os partidos monárquicos estiveram, durante muito tempo, proibidos. A base jurídica do Estado, nomeadamente no âmbito da independência do poder judicial e do respeito pelas liberdades e garantias individuais, foi duramente afectada através das ingerências de um poder político que ostentava a legitimidade revolucionária.

A base censitária do regime político diminuiu 75%, uma vez que os republicanos diminuíram drasticamente o número de cidadãos com direito de voto, incluindo a proibição explícita do voto feminino. A I República representou, em relação ao sistema monárquico constitucional, uma regressão brutal no âmbito das liberdades e garantias dos cidadãos.

A ditadura militar e o Estado Novo, que sucederam à I Republica, mantiveram a forma republicana do Estado. Aliás, o artigo 7.º da Constituição Política da República Portuguesa definia o Estado português como “uma República unitária e corporativa”. O artigo 74.º da mesma Constituição estabelecia mesmo que “são inelegíveis para o cargo de Presidente da República os parentes até ao 6.º grau dos reis de Portugal”.

O 25 de Abril de 1974 pôs termo à II República. No entanto, o novo regime continuou a negar aos portugueses uma escolha livre entre república ou monarquia. A Constituição da República Portuguesa de 1976 foi elaborada num contexto de tutela militar e de uma pressuposta legitimidade revolucionária.

O texto constitucional, que resultou da soma destes condicionalismos, foi o possível no âmbito de um processo político muito condicionado pela esquerda militar, de tal forma que ficou consagrado constitucionalmente o tal destino e “caminho para uma sociedade socialista”.

Como não podia deixar de ser nestas circunstâncias e condicionalismos ideológicos, a III República retirou ao povo português a possibilidade de optar, de forma livre, entre a monarquia ou a república. Os republicanos postularam a superioridade democrática da república em relação à monarquia e impuseram, de forma dogmática e coerciva, um regime que não pode ser livremente referendado pelos cidadãos.

Importa, neste contexto, assinalar que um regime republicano não corresponde, necessariamente, a uma democracia. Países como a Coreia do Norte, a China ou Cuba são, do ponto de vista constitucional, repúblicas, no entanto poucos classificarão estes países como democracias.

Por outro lado, é inegável que monarquias europeias como a Holanda, a Dinamarca, a Bélgica, a Suécia, o Reino Unido, a Noruega, o Luxemburgo ou a Espanha se encontram entre as democracias mais prósperas e estáveis do mundo. O mesmo se pode afirmar em relação a outras monarquias não europeias, como o Japão, a Nova Zelândia, a Austrália ou o Canadá.
Limitação à liberdade
Em todos estes casos, a monarquia significa democracia, estabilidade e prosperidade. A estabilidade política que propiciam, a convergência do esforço nacional que motivam e a adaptação social que permitem, a partir da solidez e união do projeto nacional, são fatores que demonstram que monarquia e modernidade são dois conceitos convergentes.

A este respeito veja-se o atual debate em Espanha a respeito da natureza do regime. O líder do PSOE, Alfredo Pérez Rubalcaba, defendeu, assim, a natureza democrática da monarquia no âmbito do debate da Lei da Abdicação do Rei Juan Carlos I: “a Espanha é uma monarquia parlamentar.

Porque a nossa Constituição só reconhece uma soberania: a soberania popular. Não existe uma soberania real e outra popular. Não. A soberania nacional reside no povo espanhol, do qual emanam todos os poderes do Estado.

Ou seja, em Espanha existe um Rei, mas os espanhóis não são súbditos mas sim cidadãos de pleno direito. De essa soberania, que reside no povo espanhol, emanam, como dizia, todos os poderes do Estado; também os da Coroa, cujas funções e competências estão estabelecidas e explicitadas na Constituição que foi referendada pelos espanhóis.

Essa é a origem da sua legitimidade: a vontade dos espanhóis, expressada de forma livre e democrática em referendo”. Resta acrescentar que a Constituição do Reino de Espanha permite a realização de um referendo a respeito da forma de governo, algo que a “democrática república portuguesa” não permite.

Em Portugal, a república encontra-se blindada na Constituição. De acordo com a Constituição da República Portuguesa, este país não pode ser outra coisa que não uma república. A alínea b) do artigo 288.º da Constituição estabelece, como limite material de revisão constitucional, a “forma republicana de governo”.

A República Portuguesa é o único regime da Europa Ocidental que impede, através da Constituição, a realização de um referendo a respeito da forma de governo. A natureza republicana do Estado é irrevogável, com independência da vontade popular.

Numa verdadeira democracia não deveria ser a população a optar livremente pela forma de regime? Não constitui esse facto uma limitação à liberdade de escolha dos portugueses? Não constitui esse facto a derradeira herança política da I República e do Estado Novo: a legitimidade revolucionária e a natureza irrevogável da forma republicana do Estado? Um regime que não vai a votos não é verdadeiramente democrático. O actual regime é uma democracia para os republicanos e uma ditadura de regime para o conjunto da nação portuguesa.
Um árbitro parcial
Uma nação como Portugal, cujas origens se perdem no tempo, não pode continuar a deitar fora oitocentos anos de História. Precisamos da nossa monarquia e da nossa identidade histórica para agregar o nosso povo e voltar a enfrentar as tempestades do presente e do futuro com a certeza de que voltaremos a triunfar. Uma mudança de regime significa uma oportunidade para que os portugueses e Portugal possam começar de novo.

A monarquia representa a independência e a equidistância do Chefe de Estado. É necessário voltar a ter um Chefe de Estado moderador, neutral e representativo do conjunto social e político da nação.

Um Chefe de Estado que represente a continuidade histórica do projecto nacional e a plena soberania da nação portuguesa. Um Chefe de Estado que evite o monopólio do sistema político por parte dos partidos políticos e que constitua a trave mestra de um sistema político aberto à sociedade civil.

O sistema político republicano, monopolizado por facções partidárias incapazes de realizar qualquer compromisso nacional e de convergir em nome do supremo interesse nacional, destruiu a independência nacional e promete destruir qualquer ideia de futuro para o povo português.

A descrição constitucional do Presidente da República como símbolo da unidade da nação e da neutralidade no exercício do poder é uma ficção. Na prática, os presidentes da república são chefes de fação e representam pouco mais que os cerca de 50% dos eleitores que votaram neles. Representam tendências ideológicas e partidárias que transportam para a chefia do estado.

Neste âmbito, é interessante notar que os quatro Presidentes constitucionais foram líderes de partidos políticos (PS, PSD e PRD). Representam um árbitro escolhido por uma das equipas em jogo. O papel que desempenham é, assim, exactamente o contrário do que lhes está consignado constitucionalmente. Representam um factor de instabilidade política no âmbito da coabitação institucional e o paternalismo político beneplácito se partilham a mesma origem partidária do Governo.

Nestas condições políticas e de regime, importa que a nação portuguesa, única detentora da soberania nacional, possa escolher, em liberdade, a forma política do Estado. Que possa optar livremente entre república ou monarquia.

Paulo Estêvão