Custa tanto ver 40 anos tão bem aproveitados nos séculos XIII-XIV e tão malbaratados nos séculos XX-XXI
El-rei D. Dinis governou de 1279 a 1325. A sua prioridade foi a organização do país. Mandou lavrar um considerável acervo de leis aplicáveis à generalidade do território - por oposição à dispersão normativa própria da Idade Média - e ordenou a compilação de leis avulsas e a sistematização do direito consuetudinário municipal.
Uma leitura dessa legislação detecta a preocupação com tudo aquilo que hoje dizemos ser o direito processual, ao qual começou a ser dado um peso tão importante como ao direito substantivo. Essa preocupação era, em concreto, a de dotar a administração do Estado de modos uniformes de proceder, com o que se igualizam os direitos dos cidadãos e estrangeiros, mas também a de centralizar e reforçar o poder régio.
Foi grande a preocupação, nesses 40 anos, de dotar Portugal de normas legais gerais e abstractas que, dentro da mundividência medieval e sem beliscar a estrutura da sociedade existente, garantissem a maior igualdade possível entre cada estalão de "iguais".
D. Dinis disciplinou os modos de proceder dos juízes, dos persoeiros e dos vozeiros, que é como quem diz dos magistrados judiciais, procuradores e advogados. Criou ainda os corregedores, magistrados que representavam a coroa em cada comarca, levando a presença do poder real para além dos domínios próprios da coroa, lançando as bases de uma rede de justiça uniforme e "distante" dos poderes locais, que se acreditava não resistirem a tentar influenciar os julgadores.
Sábio organizador do Estado, D. Dinis usou como principal instrumento de governo a primeira verdadeira reforma do sistema judicial, e fê-lo por constatar que essa era a melhor forma de garantir o próprio poder do soberano: um poder meramente "formal" sobre os súbditos, como acontecia em todo o mundo feudal, dava espaço ao surgimento de poderes intersticiais e à corrupção dos princípios e regras que se desejavam uniformes. Uniformidade de processos e procedimentos era a melhor forma de moralizar a realização da justiça!
No que à legislação criminal respeitava, vigorava um sistema de penas pecuniárias para a prática de crimes, as chamadas coimas, cuja aplicação não afastava a aplicação da sanção física ao caso cabível.
Fiscalmente, o crime compensava a colectividade.
Por fim - não só manifestação de humanidade, mas também de preocupação económica -, iniciou-se um processo de substituição das penas de morte e de encarceramento por penas de degredo para terras raianas: assim se povoava o território e se garantia o seu aproveitamento económico.
Como todas as reformas exigem fundos, D. Dinis recorreu à exploração intensiva de minérios e madeira, o que levou a incrementar relações comerciais, nomeadamente com Inglaterra, e fundar aquilo que viria a ser a Marinha portuguesa. Impulsionou o comércio, autorizando e potenciando a realização de feiras, para tanto reduzindo impostos: ganha-se mais cobrando muitas vezes pouco do que poucas vezes muito!
Como se tudo não bastasse, foi um dos mais cultos homens do seu tempo, tendo criado em 1290 os Estudos Gerais, gérmen da universidade portuguesa.
Custa tanto ver 40 anos tão bem aproveitados nos séculos XIII-XIV e tão malbaratados nos séculos XX-XXI.
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